sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Entrelinhas da Vida - Capítulo 4 (cont.) - E as estrelas brilham lá no longe...

     Porque as vezes o estar longe também pode ser bom, mesmo que a vontade seja estar perto.
     Era uma noite de Verão calma, não fazia nem frio nem calor, estava um tempo muito agradável.
     May estava sozinha, deitada de costas na relva, como tantas vezes fazia, a olhar o céu. O céu estava coberto de estrelas que brilhavam felizes na noite clara, tantas, tantas que até pareciam estar pertinho. 
     Deitada no chão no meio da noite, os pensamentos de May voavam para longe. Já passara algum tempo desde a última vez que ela estivera com Gonçalo, demasiado tempo a seu ver, mas era assim a vida deles. Um longe constante um do outro que resultava numa saudade constante também. 
     May pensou sobre a última vez que estiveram juntos, e lembrou-se também de Martinha, aquela menina incomum que vivia durante algum tempo com Gonçalo.
     Depois pensou quando é que poderia voltar novamente para perto deles mas desistiu desse pensamento pois chegou à conclusão que não fazia a mínima ideia quando seria. Podia levar muito tempo ainda...
     E se as coisas fossem diferentes? Tantas pessoas que têm a pessoa que amam a seu lado e não dão valor e outros que tanto gostariam de estar perto não podem... May pensou como seria se pudessem estar juntos sempre que quisessem, mas não havia pressas, May não tinha problemas em esperar. 
     Ao olhar o céu estrelado, May lembrou-se de um dia quando os dois estavam sentados no tecto de sua casa a olhar o céu também e Gonçalo dissera:
     - Vês como as estrelas são lindas lá no longe? E são tão lindas exactamente por estarem longe. Se estivessem ao nosso lado não poderíamos apreciar a sua beleza... O longe não tem de ser algo mau. E não vamos esquecê-las por estarem longe. Há noites em que não as vemos ou apenas vemos algumas delas mas elas sempre estão aí em cima a lembrar-nos que existem, a mostrar-nos a sua beleza. São como nós, estamos longe um do outro, talvez haja dias em que nem ouvimos nada um do outro mas temos sempre certeza que estamos aí. E vamos ficar aí.
     Quem sabe se naquele momento, algures lá no longe Gonçalo não fazia o mesmo, olhava as estrelas que eram exactamente as mesmas e sabia que May estava aqui, à sua espera. Ou talvez o céu estivesse escuro e as estrelas tapadas por nuvens, mas fosse como fosse elas lá estavam. Longe mas brilhavam na mesma.
     
(continua...)

     

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Entrelinhas da Vida - Capítulo 4 (cont.) - "A menina do guarda-chuva"

     Temos o nosso grupo de amigos, o grupo de pessoas conhecidas, o nosso "mundo". Até que aparece mais alguém e quer queiramos quer não esse alguém passa a fazer parte do nosso "mundo" também.
     Era tarde, quase noite e se durante o dia o tempo melhorou a tempestade prometia voltar nessa noite. Não era o tempo de alguém andar sozinho na rua principalmente não uma menina como a que andava pelo passeio com passos firmes e rápidos, provavelmente para a sua casa. Só que não era para a sua casa.    
     Já chovia, não torrencialmente, mas o suficiente para se molharem. Mas aquela menina, quem via pensava que era uma menina, mas também podia ser uma senhora baixinha, não era possível ver a sua cara pois ela segurava um enorme guarda-chuva vermelho que não permitia as pessoas verem a sua cabeça. Com uma mochila grande nas costas e uma malinha numa mão e um guarda-chuva no outro, a menina caminhava  apressadamente sempre pela estrada principal. 
     Parecia muito certa do caminho que tinha de seguir, mas quando passou por um cruzamento ficou um bocadinho a olhar se devia ir para a direita ou a esquerda. Havia um clube na próxima casa da esquerda as músicas ouviam-se na rua. À porta do clube  um jovem olhava a chuva.
     A menina passou, depois parou e voltou para trás. 
     - Desculpe, pode me dizer onde onde fica isto? - perguntou, mostrando-lhe uma morada que tinha escrito num papel.
     - É na próxima rua, a segunda casa da direita. Queres que te acompanhe até lá? Meu primo está lá dentro a cantar, coisa que não faço, e tenho de ficar aqui à espera, ainda vai demorar.
     - Obrigada, não é preciso, vim sozinha até aqui também chego lá.
     - Gosto do teu guarda-chuva. - o rapaz estava com vontade de meter conversa.
     - Foi minha irmã que mo ofereceu há muitos anos.
     A menina agradeceu novamente pela ajuda, o jovem loiro de olhos azul bebé sorriu e ela continuou o seu caminho.
     Começou a chover torrencialmente e já estava escuro. A menina bateu à porta.
     Anny que estava a ver Pretty Little Liars deitada no sofá levantou-se a pensar quem seria a segunda visita, depois de Maggie, naquele dia. Ao abrir a porta arregalou os olhos mostrando a sua surpresa: 
     - Larita!
     - Maninha!
     A menina pôs o guarda-chuva no chão, e já dava para ver a sua carinha sorridente, era uma menina com cerca de 15 ou16 anos de cabelo encaracolado escuro. Pôs o guarda-chuva juntamente com a mala e a mochila, deixando uma poça atrás de si e abraçou Anny.

     (continua...)
   

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Entrelinhas da Vida - Capítulo 4 - As coincidências continuam...

    Se não tiveres mais nada a que te agarrar, resta a música. Nos momentos de alegria, de tristeza, de solidão, de desespero... Música é sempre um bom remédio. Pelo menos para algumas pessoas como Sue.
     Às vezes nem é preciso estar-se alegre ou triste ou seja lá o que for, mesmo assim recorre-se à música.
     Era um tarde quente, mas até que se estava bem à sombra da árvore. Sue, Sebastião e mais duas colegas de trabalho aproveitavam o resto do intervalo de almoço sentados a descansar à sombra no pequeno parque que ficava ao lado do hospital. Com tanto stress durante o dia todo, aquele bocadinho de descanso sabia mesmo bem. 
     Não estava ninguém por perto além deles os quatro e Sue tocava na sua guitarra. Quando eram músicas que todos conheciam, começavam a cantar e era uma alegria.
     - Vamos combinar alguma coisa para este fim de semana já que estamos todos livres...
     - Acho bem, conheço um clube muito giro com uma decoração diferente onde costumam cantar karaoke todos os segundos fins de semana, e quem quiser levar instrumentos pode. Cantam por equipas, e com a Sue na nossa os outros não têm hipótese.
     - Sim, sim... Eu posso ir com vocês mas nem pensem que me vão ouvir cantar. Até parece que não me conhecem já...
     - Então, também tocas e cantas aqui para nós, não existe razão para ser diferente lá. A nossa rica hora de almoço já chegou ao fim, vamos lá, não convém chegarmos atrasados.
     E lá foram os quatro.
     Os longos e cansativos dias passaram e finalmente chegou o fim de semana. Sábado à tardinha os quatro  amigos foram ao clube que já estava bastante cheio e Sebastião inscreveu-os para cantarem.
     - Não vale a pena meteres o meu nome aí, já sabes que não vou cantar. - disse Sue que estava atrás dele.
     -Vá lá, só desta vez. Ninguém te conhece aqui. E vamos divertir-nos todos.
     - Fico sentada a ver.
     - Fogo, que teimosa... Já sei que não vais mudar de ideias, mas só para o caso de mudares meto o teu nome na mesma.
     - Mais vale poupares a tinta da caneta.
     Sue foi sentar-se numa mesa perto do bar e do palco enquanto os outros três foram lá para a frente para junto dos outros concorrentes.
     Ainda não havia começado, quando alguém veio por trás dela e disse-lhe:
     - Não vais cantar também? 
     Sue virou-se, aquela voz não lhe era estranha e de facto era Xavier que lhe falava.
     - Olá. Não vou não, só venho apoiar os meus amigos.
     Xavier sentou-se na cadeira livre ao lado dela.
     - Devias, dás cabo daquilo tudo.
     - Não dou não. E não gosto de cantar em público... Tu não participas?
     - Vou cantar sim, mas não tenho companhia, será eu sozinho contra outra equipa, a não ser que queiras cantar comigo.
     - Ahah, não obrigada.
     - Então ficas a beber aqui, vou lá para a frente, já sei que não é a mim que vais apoiar, mas vou fingir que sim. Deixa-me pagar-te alguma coisa, o que gostas?
     - Não é preciso, vai lá cantar, já vão começar.
     - Uma caipirinha para esta menina se faz favor. - Xavier fez o pedido, pagou e foi para junto dos outros concorrentes.
    Não eram assim tantos participantes, mas ainda havia alguns. Quer a equipa de Sebastião quer Xavier estiveram bem e passaram algumas eliminatórias até que calhou os dois cantarem juntos. Tinham de cantar 3 canções e quem tivesse a maior pontuação em duas delas passava a fase seguinte. Primeiro cantaram a Chasing Cars dos Snow Patrol em que a equipa de Sebastião venceu por muito pouco, depois a For the First Time dos The Script em que Xavier venceu também por muito pouco.
     Ambos olhavam atentamente para Sue enquanto cantavam como se estivessem cantando apenas para ela no meio da multidão e Sue mostrava que apoiava a sua equipa o que parecia deixar Xavier um pouco desiludido apesar de ele já estar à espera.
     Por fim chegou a última música e quando começou a tocar Sue riu-se e viu que Xavier também estava com um enorme sorriso. Era a Secrets dos One Republic. A música que Sue cantara na varanda quando "conheceu" Xavier.
     A diferença não foi muito grande, mas ainda assim Xavier ganhou passando a fase seguinte.
     Sebastião e as colegas foram ter com Sue e Sebastião disse meio a gozar meio a sério:
     - Aquele homem anda a perseguir-te. Vai para todos os lugares que vais tens de ter cuidado.
     - Claro, ele ia adivinhar que eu viria cá hoje...
     - Foi por tão pouco... Faltavas tu na nossa equipa.
     - Tiveram muito bem.
     Xavier conseguiu passar mais uma fase mas perdeu a seguir e quis vir para a mesa de Sue mas começaram a chegar mais gente e já não deu.
     Estava a tornar-se sufocante e Sue e os amigos decidiram ir embora. De qualquer maneira já era tarde.

(continua...)



quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Entrelinhas da Vida - Capítulo 3 (cont.) - Anny e Maggie

     - Vai tomar banho, há toalhas no armário e se quiseres eu posso emprestar-te roupa minha. - disse Anny enquanto lhe mostrava onde era a casa de banho.
     - Obrigada, mas devias pensar melhor em levar pessoas estranhas a tua casa... Sabes lá que tipo de pessoa eu sou...
     - Não tenho medo. Vou fazer qualquer coisa para comermos fica à vontade.
     Meia hora depois Maggie e Anny estavam sentadas na sala a comer torradas com nutella enquanto Gastão, deitado aos pés de Maggie, pedia com uns olhos suplicantes um bocadinho de pão.
     - Não podes comer chocolate faz-te mal. - Maggie acariciou o pêlo molhado de Gastão que baixou a cabeça com cara triste.
     - Então que te aconteceu afinal para andares perdida na floresta no meio de uma tempestade?
     - Não tens de ir a algum lado? Encontrei-te pelo caminho e voltaste para a tua casa comigo...
    - Eu ia a caminho do trabalho mas a minha colega não me veio buscar portanto chegaria atrasada de qualquer maneira, não te preocupes. Hei de ir hoje a tarde. Ainda estás a sangrar da perna. - Anny foi buscar a caixa de primeiros socorros e tratou da perna dela.
     - Bem, queres saber a minha maravilhosa aventura? - Maggie encostou-se para trás no sofá, cansada, e começou a contar a sua história.
     - Estás cansada, se quiseres vai dormir um pouco e depois contas.
   - Eu aguento, aguentei até agora... Ontem fui visitar os meus avós e voltei à noite, vivo longe deles e quando estava a meio do caminho faltou a gasolina e fiquei parada, ainda consegui pôr o carro na berma e comecei a andar a procura do próximo posto de gasolina. Fui pelos caminhos desertos no meio dos serrados  porque assim poupava uma hora de viagem, o que foi um erro porque não apanhava rede lá e também não passavam carros nenhuns. Pensei ficar de noite no carro e esperar pela manhã, mas pensei lembrar-me que se fosse pelo próximo cruzamento chegaria à estrada principal e havia um posto bem perto. Enchi-me de coragem e fui apesar da chuva que estava a ficar cada vez mais forte. é claro que me perdi, sou péssima em orientação, e quando dei por mim estava no meio da floresta e no meio da tempestade. Gritei, caí, pensei que iria ficar lá para sempre, até que amanheceu e encontrei-te a ti. E foi sem dúvida das piores noites da minha vida.
      - Coitada de ti... Tinhas voltado para o carro pelo menos ficavas abrigada... O cão não te ajudou a encontrar o caminho?
     - O Gastão? Coitadinho estava com mais medo do que eu, já é muito velhinho já não consegue cheirar muito bem... Olha obrigada por tudo, vou buscar gasolina e apanho um taxi até ao meu carro. És muito simpatica, vou recompensar-te pela ajuda.
     - Ah não é preciso, gostei muito de te conhecer, preferia que fosse noutra situação mas...
     - Havemos de combinar um dia para almoçarmos...
     - Ok, gostava muito.

(continua...)
     
     

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Entrelinhas da Vida - Capítulo 3 (cont.) - Um Encontro na Floresta

     Esperar. Até quando? Anny encostou-se à parede de pedra que ficava ao lado da porta de entrada da casa mas endireitou-se logo pois a parede estava fria e húmida.
     Para variar, chegaria mais uma vez atrasada ao trabalho e iria ouvir um sermão do chefe mas por mais zangado que ele ficasse nunca a mandaria embora pois sabia que não encontraria igual tão depressa.
     Estava bastante frio depois da tempestade da noite e pelos vistos Anny não teria boleia nesse dia. Por vezes a colega de trabalho não aparecia sem avisar e Anny ficava pendurada à espera, como hoje.
     Com demasiado frio para estar quieta, Anny caminhou em direcção ao trabalho, caso a colega aparecesse apanhava-a. Que tempo estranho, não era suposto estar tanto frio nessa época e a chuva também prometia voltar de novo. Anny apertou o casaco à sua volta e começou a apressar o passo.
     Era triste, levantar-se tão cedo para não chegar a horas...
     - A minha vida precisa de uma mudança, estou farta disto tudo. - murmurou para si mas calou-se envergonhada quando um velhinho que passava na rua parou para escutar o que ela dizia.
     - Bom dia menina.
    - Bom dia. - Anny ainda apressou mais o passo até chegar aquele caminho de terra que passava pela floresta.
     Cheirava a terra molhada e a gasolina quando um carro passou por ela e Anny pensou que se calhar até não seria um dia tão mau assim.
     Ainda era um bocado longe até ao local de trabalho, pelo menos uma hora pelo mato. Um passeio sem incidentes, pelo menos era o que Anny pensava e esperava, mas nunca se sabe o que vai acontecer em qualquer momento, em qualquer lugar...
     Anny cantarolava enquanto ouvia "Dust in the Wind" no mp3 e por isso não ouviu logo quando alguém a chamou.
     De um cruzamento, vinha uma jovem senhora completamente molhada com um cão nos braços.
    Quando finalmente a ouviu, Anny aproximou-se daquela jovem que tremia de frio, com a roupa e o cabelo  sujo de terra, olheiras profundas e as calças sujas de sangue numa perna.
     - Sabes dizer-me onde estou? Tou a caminho a noite inteira e completamente perdida com o meu óptimo sentido de orientação...
     - Vem, eu ajudo-te. Ainda temos de andar um pouco para sair daqui...
     - Não posso mais... Deixa-me descansar um bocadinho... Que noite...
     - Ok, mas é melhor nos despacharmos, precisas de mudar de roupa e tomar um banho quente, ainda ficas doente assim. Como te chamas?
     A jovem sentou-se no chão, afastando uma madeixa loira da cara e respondeu:
     - Podes crer, nunca precisei tanto na minha vida. Maggie.
     -Então que se passou para estares assim?
(continua...)