sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Por vezes pergunto-me, onde ficou aquele tempo em que ansiava por notícias tuas. Ficou o tempo perdido algures no meio desta enorme distância? Talvez. É quase engraçado, o facto, quanto mais perto estamos, mais há para escrever e  para contar. Quando estamos longe e o tempo passa e cada um vive a sua vida, as novidades deixam de existir. Cá e lá contamos algo que parece ser interessante, quando de facto não o é. As palavras ficam perdidas e deixamos de saber o que mais escrever... E o contacto perde-se, não por deixarmos de sentir saudades, não por não termos sido uma parte importante na vida do outro, simplesmente não encontramos as palavras. O que não quer dizer que não nos amemos, porque quando cruzamos aquela distância que nos separa, voltamos a encontrar o tempo, aqueles dias em que estávamos tão habituados a conversar e a conviver um com o outro. E parece que nada mudou afinal, parece que nunca houve tal distância. E isso serve de consolo, saber que apesar de não estares cá, de não fazeres parte da minha vida presente, quando nos encontrarmos de novo, damos conta que na essência das coisas nada mudou. Estás aí e és meu amigo e sei que sentirás o mesmo por mim. E é por isso que escrevo-te hoje, talvez por uma última vez por algum, ou mesmo longo tempo, escrevo-te para te garantir que não precisamos de ter medo que a nossa amizade se perca no tempo, porque sei que basta partir esta distância para as coisas voltarem ao mesmo. Sim, tenho saudades dos tempos de outrora em que estávamos juntos nos fins-de-semana e fazíamos coisas banais que nos davam alegria porque estávamos juntos de pessoas que amamos. Talvez as palavras se tenham perdido mas as memórias não. E sabe bem ter a certeza que não são apenas memórias passadas mas que haverá também boas memórias futuras. Queria que soubesses isso.

Ellen

sábado, 23 de junho de 2012

Escuta

Escuta.
Consegues ouvir? Aquela voz irritante que persiste em dizer: não há história, não há segredo.
Não escutes essa voz... Escuta.
Ouves o som da Natureza? Consegues ver aquela beleza? 
Tudo confuso. Vejo no teu olhar que não entendes nada e não me apercebo que não te vejo a ti mas sim o reflexo do meu próprio olhar confuso.
Deixa-me contar-te uma história. Escutas?
Não sei como começar pois estas palavras não são a minha história. Tu és a minha história.
O primeiro capítulo da nossa história e nem sei se sequer fazes ideia da existência dela.
Será uma história com final feliz? Com final triste? Sem final algum? Será que essa história passará do primeiro capítulo? Não sei... Deixo-me surpreender por ela, qual é a piada de ler um livro cujo fim já nos é conhecido? 
Queres saber um segredo? Tu és o meu segredo.
Escuta, deixa-me que te conte, vais-te lembrar?
Esse livro que conta a nossa história, queres lê-lo comigo? Vamos subir aquele monte onde se vê o pôr do sol, senta-te ao meu lado e não precisarias de ler pois a história estaria a acontecer.
Escuta aquela voz que te conta o meu segredo. A voz que te conta aquela história.
Quanto a mim, ouço aquela voz irritante que persiste em dizer que não há segredo. Que não há história.
Não escuto.


Ellen

Back...

Já passou tanto tempo e tão depressa que nem dei por ele a passar.
Sempre soube que um dia voltaria aqui. Que voltaria a deixar em palavras aqueles sentimentos que penso sentir ou os pensamentos que desejo inventar. Serão reais? Não sei dizer...
Lá fora escurece e não tenho noção das horas... Entardece. Ouço o ribombar dos trovões e de vez em quando os raios de luz parecem atravessar este pequeno quarto iluminado apenas por uma vela.
Nunca ouvi tal trovoada, parece que a qualquer momento as paredes vão abaixo. Se tenho medo? Não. Não receio a trovoada mas desejava não estar aqui sozinha. Ocorres-me nos pensamentos, aquele teu sorriso que faz toda a escuridão desaparecer. Quanto tempo passou desde a última vez que vi esse sorriso? Semanas? Meses? Não, nem dias nem horas nem minutos pois vejo esse sorriso teu que está presente na minha mente. Se pudesses estar aqui comigo, aconchegar-me-ia nos teus braços, fecharia os olhos e ouviríamos a trovoada  juntos até adormecer. 
Mas não fecho os olhos nem adormeço pois estou sozinha neste quarto, guardando o meu segredo, vejo a luz da vela tão pequenina que mal ilumina o quarto entretanto escuro, como uma esperança que treme à beira de se apagar. Mas essa luz não se apaga sozinha, apenas se eu deixar... E alimento a esperança com a tua presença e penso se alguma vez estou presente na tua mente também assim?
Apago a vela.

Ellen

quarta-feira, 7 de março de 2012

Entrelinhas da Vida - Capítulo 5 - Palavras sem voz

     Existem muitas pessoas na nossa vida que amamos. Temos o nosso grupo de amigos, a nossa família e sentimo-nos preenchidos, sentimos que não precisamos de mais ninguém para sermos felizes. E no entanto, é incrível como o nosso coração tem lugar para tanta gente. E sempre há a porta aberta à espera de mais alguém para entrar. Pelo menos era assim no caso de Anny. Fazer novas amizades, conhecer novas pessoas, novas personalidades, era algo que ela gostava imenso. 
     No entanto, por vezes conhecemos pessoas que desejaríamos nunca ter conhecido. Talvez porque são do tipo de pessoa que não suportamos ou talvez apenas a tenhamos conhecido em circunstâncias erradas.
     Naquele dia, um dia como outro qualquer, com a única diferença de que Anny acordara extremamente mal disposta, sem vontade nenhuma para nada, o céu estava de um estranho cinzento e coberto de nuvens que não deixavam adivinhar se vinha chuva ou sol...
     O dia começara mal e pelos vistos iria acabar da mesma maneira, primeiro Anny teve de se levantar demasiado cedo para aturar o chefe, a torneira da casa de banho não parava de pingar e ela ainda não arranjara tempo de a consertar, as paredes do corredor precisavam urgentemente de uma pintura por causa da humidade e estava um frio desagradável. Ao sair de casa ia entalando a gata na porta, sem querer, e ela fugiu a miar assustada. As escadas estavam um pouco cobertas de musgo e Anny escorregou os últimos dois degraus no exacto momento em que duas senhoras de idade passavam pelo caminho. As calças ficaram com marca verde num dos lados mas Anny  não tinha vontade de voltar para mudar de roupa, já que estava ligeiramente atrasada, e atraso era algo que o chefe não aturava de forma alguma.
     O chefe estava mal disposto e chateava-se por cada pequeno pormenor o que deixou Anny ainda mais mal humorada. Era sem dúvida um dia para esquecer.
     Mas, a gota de água veio no final do dia. O céu continuava cinzento, sem chuva, sem sol, chuva que poderia vir a qualquer momento e sol que poderia aparecer a qualquer momento. Anny saiu do trabalho quase uma hora e meia depois do suposto, o que não ajudava nada em melhorar o dia, pensou na torneira por arranjar, ainda tinha de ir ás compras se quisesse algo para o jantar, e estava um frio ainda mais desagradável do que de manhã. Anny andou apressadamente, primeiro pela rua quase deserta, depois por meio de uma multidão de gente, depois novamente por uma rua quase deserta e quando estava quase a chegar a casa, ao virar da esquina um jovem vinha a correr do outro lado e bateu em cheio nela. A mala voou e como o fecho estava meio aberto as coisas espalharam-se pelo chão e Anny teria o mesmo fim não tivesse ele agarrado o braço dela segurando-a de modo que ela conseguisse voltar a ganhar o equilíbrio. Aliás, segurou-a com tanta força que até magoou. Depois abaixaram-se ao mesmo tempo para ajuntar o material caído e deram uma cabeçada um no outro. Anny estava super desconcentrada e irritada, pela influência daquele dia e por tudo que lhe corria mal e disse sem esconder as suas emoções:
     - Tenha mais cuidado.
     O pior de tudo é que o jovem nem se deu ao trabalho de pedir desculpa, apenas olhou também desconcertado para ela e levantou as mãos num gesto de: a culpa não foi minha...
     Idiota. Anny meteu tudo na mala apressadamente mas teve de voltar a tirar e meter de novo direito para caber tudo. O jovem continuava a olhar para ela, ao menos fosse embora.
     Alguns segundos depois Anny continuou o seu caminho e só reparou que o jovem a seguia quando este lhe tocou de leve no braço para chamar a sua atenção. Anny virou-se impacientemente e ficou a espera das palavras, provavelmente de desculpa que sairiam da sua boca. Esperou mas não veio nada. Por um momento ele abriu a boca como que para dizer algo mas depois ficou apenas ali parado e mudo. Levantou mais uma vez ambas as mãos no gesto de: não fui eu, depois virou-se e foi embora.
     Idiota.
     Anny chegou a casa e nem reparou que o sol finalmente aparecera um pouco puxando as nuvens cinzentas para longe.