sexta-feira, 25 de março de 2011

Entrelinhas da Vida - Capítulo 1 - A Orquídea

    Dois jovens sentados frente a frente numa pequena mesa com um um tabuleiro de xadrez a separá-los.
  O mais novo olhava com  toda a concentração para os passos do adversário, puxando o cabelo loiro para trás que insistia em lhe cair para os olhos.
  Com os seus 18 anos parecia ter 16, era pequeno e franzino de olhos demasiado azuis que pareciam quase falsos. Brincava nervosamente com as peças que tinha conquistado do adversário, cuja maioria estavam na sua mão. Queria por força ganhar o jogo e parecia estar prestes a conseguí-lo.
  Um raio de sol espreitou pela janela, iluminando aquele quarto enorme e mostrando o pó que brilhava naquelas mobílias luxuosas. Parecia que pouco a pouco a Primavera decidira acordar, prometendo uma manhã clara como já não havia há dias.
   O mais velho, que devia ter entre os 20 e 30 anos, parecia perdido nos seus pensamentos sem prestar grande atenção ao jogo. Quando viu a manhã clarear, levantou-se da mesinha abandonando o jogo e foi até ao guarda-fato, para escolher cuidadosamente a roupa e o perfume para aquele dia.
   - Hey, vais desistir do jogo!?- perguntou o mais novo semi revoltado.
   - Calma primo, tudo a seu tempo. 
   Sem pressa, o mais velho voltou para a mesa e sem se sentar moveu o único cavalo que tinha dizendo:
   -Xeque-mate.
   O novato ficou a olhar estupefacto para se dar conta de que realmente acabara por perder o jogo, como de costume aliás.
  O vencedor olhou sorrindo apenas com a boca para o primo e disse-lhe, simplesmente:
  - Não te preocupes, és um bom jogador. Continua e um dia farás parte dos melhores.
   - Claro, afinal é só um jogo...- disse resignado, arrependendo-se logo das suas palavras ao ver o olhar sério que o primo lhe lançara. 
   E ao ver como o outro se preparava a rigor para sair, invejando secretamente a sua altura, força, bem parecer e inteligência do primo, perguntou:
   - Onde vais?
  - Preciso encontrar uma certa pessoa... Já passou uma semana, hoje é o dia.- respondeu-lhe mais para si próprio do que outra coisa.
  O pequeno olhou-o surpreendido pela seriedade da sua expressão, enquanto o mais velho o olhava fixamente, como quem diz: "percebeste?"
   A surpresa do moço passou, e ele começou a rir-se:
   - Uma rapariga?
  O outro baixou os olhos e puxou o fecho do casaco parecendo embaraçado, o que resultou no, ainda maior, riso do primeiro. 
  Xavier, era esse o seu nome, sorriu-lhe dizendo com o olhar: "sabes bem", e depois saiu para aquela manhã clara, quase primaveril.

***

   Sue caminhou apressadamente até à estação de comboio, por aquele caminho tão conhecido enquanto mil e umas recordações lhe passavam pela cabeça do seu tempo de universidade quando tinha de percorrer aquele caminho todos os dias. Já lá iam algum tempo e no entanto parecia ter sido ontem.
   O carro com o qual costumava ir ao trabalho ainda estava na oficina e lá ficaria até ao final da semana.
   Eram 6:00 horas da manhã, noite escura ainda, mas não tardaria muito até ao nascer do dia.
   Sue amaldiçoou mais mais uma vez a hora em que o carro deixara de andar, senão ainda estaria a dormir durante mais uma bela hora. Lembrou-se de May que viera passar uns dias com ela e que prometera acompanhá-la até a estação, mas quando saiu de casa sua irmã dormia tão profundamente que Sue não teve coragem de acordá-la.
   O comboio já lá vinha e Sue entrou numa carruagem e qual não foi a sua surpresa ao ver o enfermeiro Sebastião, seu melhor amigo.
   Sebastião arregalou os olhos e disse com cara de assustado:
   - Doutora Sue?!
   - Eh Skinny.- respondeu ela rindo e sentando-se à sua frente, de modo que o comboio parecia andar para trás.
   - Tudo bem? Como é, vais também de comboio hoje?- perguntou-lhe aquele homem moreno, alto e magro, demasiado magro que lhe dava um ar frágil e que lhe custou o apelido de Skinny.
   - Tou sempre bem... O carro avariou, portanto esta semana vai ser sempre comboio.
   - Não é mau de todo, vou sempre de comboio para o trabalho.
   - Também gosto de andar de comboio, mas de carro levanto-me mais tarde e levo metade do tempo.
   - Pois... São quase duas horas de viagem... Se quiseres dorme e acordo-te quando chegarmos.
   - Agora não consigo mais.
  - Vem sentar-te deste lado, o nascer do sol é muito mais lindo de se ver deste lado. O céu está claro, parece-me que vamos ter um belo dia hoje.
   Sue sentou-se ao lado do amigo. A carruagem estava praticamente vazia, com excepção de um casal de velhotes, um jovem adolescente que dormia com a cabeça caída para frente, uma solteirona de meia idade que lia revistas em cuja capa sorria o Bieber, e um casal de namorados, juntos com uma amiga.
   - Costuma estar sempre assim vazio?
   - Quase sempre. Vais ver, daqui a quinze minutos a velhota vai pegar no sono e o velhote não vai tirar mais os olhos da senhora das revistas, mas ela não dá por isso e sai na próxima estação. O adolescente começa a babar-se até acordar por sentir a baba escorrer, limpa com a manga e volta a dormir. A miúda que está com o casal de namorados é a melhor amiga da rapariga, mas está apaixonada pelo rapaz, ele sabe e acha piada, a namorada não sabe de nada. A velhota vai começar a falar sozinha enquanto dorme e o marido responde-lhe sem saber bem o quê... E basicamente é isso.- respondeu-lhe baixinho de modo a que ninguém ouvisse.
   Sue riu-se e observou disfarçadamente os companheiros de viagem. E realmente, aconteceu exactamente como Sebastião dissera, excepto o facto do velhote em vez de olhar fixamente para a mulher das revistas olhava muita vez para eles os dois.
   - Está a pensar que és minha namorada.- disse Sebastião.
   - Não seria o primeiro...
   No hospital muitos pensavam isso, que havia algum romance por trás daquela amizade, outros pensavam que Sebastião "se fazia" a ela por questão de interesse... Mas não era verdade, Sue e Sebastião já se conheciam há cerca de dois anos, e tornaram-se os melhores amigos apenas.
   Distraídos nem deram pelo clarear do céu e quando olharam pela janela, o sol já vinha por trás dos montes...
   - Oh perdemos a melhor parte... Pode ser que amanhã seja ainda mais bonito. Nesta viagem o nascer do sol é a única coisa que é diferente todos os dias.
   Ambos olharam pela janela, cada um com os seus próprios pensamentos a ver nascer o dia enquanto o comboio continuava o seu caminho. E de repente Sue lembrou-se daquele dia em que um homem ouvira-a cantar fora da sua janela. Ela contou-lhe o que se tinha passado concluindo:
   - Aquele sim levava-me ao altar. Era lindo, barba perfeita...
   - Aposto que ele agora passa todos os dias pela tua casa a ver se te apanha de novo.- disse ele rindo.
   - Achas? Claro que não. Aposto que já nem se lembra. Provavelmente nunca mais nos vamos ver.
   E a viagem continuou sem qualquer acontecimento de maior interesse. O tempo passava e Sue acabou por adormecer encostada ao Sebastião, para acordar logo de seguida para mais um pesado dia de trabalho.
   Quando ela chegou a casa no fim do dia, esgotada, viu na janela da sala um vaso com uma linda planta de orquídea. May estava na cozinha a fazer o jantar.
   - Como é, compraste um orquídea?- perguntou-lhe Sue enquanto arrumava as suas coisas.
  - Eu? Claro que não, foi dada..
 - Eh lá... Teu soldado ofereceu-te uma flor? Que romântico.- disse-lhe meia trocista.
  - O Gonçalo não me oferece orquídeas. Parece que tens muito para me contar... Essa orquídea foi dada para ti.- respondeu-lhe rindo e ao mesmo tempo com um olhar que pedia explicações.
  -A mim?! O quê?


(Continua...)


8 comentários:

  1. tao giro :D o enfermeiro gosta da May :P sera?

    "Nesta viagem o nascer do sol é a única coisa que é diferente todos os dias."

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  2. Da Sue queres tu dizer :p

    "Mas não era verdade, Sue e Sebastião já se conheciam há cerca de dois anos, e tornaram-se os melhores amigos apenas." xD

    O nascer do sol é diferente todos os dias de qualquer maneira, nunca é igual, literalmente lol, era isso que ele queria dizer... e de resto, romance ou não... não sei de nd :p

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  3. LOL

    Aiii se eu disse May era May! :P

    Tipo a Sue chega a casa com flor para a irmã, e ela teve com o Sebastião :P ele podia ter dado a ela para entregar à irmã. LoL

    LooL so pus a frase do nascer do sol porque é bonita, todos nós fazemos práticamente as mesmas coisas todos os dias, no entanto, podíamos fazer outras coisas, enquanto que o nascer do sol que é quase "destinado" a ser sempre igual foi o único que mudou hehe

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  4. ahhh, pera acho que entendeste mal ou então eu é que me expressei mal. Tipo a Sue chega a casa e vê a planta da orquídea na janela e pergunta a May se ela comprou ou se alguém lhe deu a flor. E a May responde que a flor foi dada para a Sue. Ou seja alguém deu a orquídea para a Sue, não para a May. Lol confuso?

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  5. loool ok escapou-me o promenor da flor estar na janela

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  6. errrm... hum ^^' afinal já começaste lol =p foi aqui no blog... eu reparei hoje... li primeiro essa, gostei, não sabia o que era, se era algum livro que leste e gostaste, ou algo assim, mas enquanto lia pareceu-me cada vez mais algo teu mesmo lol. Dps vi pra baixo as descrições das personagens e ai sim tive certeza, lembrei-me de teres falado desse projecto. Tá mto fixe, gostei muito deste que comentei, bastante mesmo. Continua =)

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